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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

O Papel do Ator

por Diones Camargo*

Vocês querem falar de amor e de sofrimento aqui em cima? Aqui em cima isso não vale nada, porque aqui tudo é mentira! O verdadeiro sofrimento está lá fora, nas ruas”. Foi com esta chicotada que a atriz Paula Zúñiga encerrou o espetáculo Neva, na noite do último Sábado, sob a respiração suspensa de um público que até bem pouco vinha se divertindo exatamente com esta característica irreal do teatro, e também com a capacidade intrínseca aos atores em transitar de um estado emocional ao outro sem necessariamente sentirem coisa alguma em suas vidas.

Escrito e dirigido por Guillermo Calderón – e interpretado por um trio de atores extraordinários – a dramaturgia impressiona por juntar fatos históricos, materiais colhidos em improvisações e trechos da obra do dramaturgo Anton Tchekhov. Neva é de radical coerência em sua proposta: numa caixa montada sobre o palco estão um tapete vermelho, uma cadeira e uma simples estufa – que, aliás, é todo o equipamento de iluminação da peça e que, conforme é movida no palco, possibilita uma vasta quantidade de informações visuais. Além disso, cenas lembram imagens de peças e fotos do período.

Mas somente quando os uivos da revolução invadem a cena é que vemos os dois tipos de sofrimento – o do teatro e o dos miseráveis – se distinguirem. Em determinado momento, Olga Knipper, atriz e viúva de Tchekov, afirma não lembrar o que sentiu quando o escritor morreu. Eles então encenam a morte do dramaturgo, numa espécie de psicodrama que, ao invés de ajudá-la a resgatar os sentimentos recalcados, a atira num prazer egoico por reviver uma situação de alto conteúdo emocional, porém irreal. E é neste jogo entre expressar sentimentos complexos e ser incapaz de sentir algo verdadeiro com a realidade à sua volta que faz de Neva uma obra que questiona não apenas o papel do artista na sociedade, mas principalmente o papel da compaixão humana na obra do próprio artista.

*Texto publicado originalmente no Segundo Caderno do jornal Zero Hora:

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