Roberto Carlos.
Quem ouviu o OverDrama da terça-feira passada, na rádio Mínima FM, deve lembrar do texto sobre Roberto Carlos que Sofia Ferreira e eu lemos ao vivo. Escrito a convite do jornal Pioneiro e publicado no dia 13/04/2013, a intenção era homenagear o músico através de depoimentos de diversos artistas, profissionais e personalidades do RS. Todos deviam falar sobre algum aspecto marcante da carreira dele, algo que merecesse ser comentado nas páginas do tal periódico. Eu, que nunca fui fã do intitulado "Rei" - e que sempre ouvi falar da sua "proximidade" com o alto escalão do poder durante a ditadura militar no Brasil - criei essa premissa para uma peça hipotética, onde juntei o passado obscuro de Roberto, suas consecutivas batalhas judiciais, ao presente obscurantista do "pastor" Marco Feliciano. No texto abaixo, acrescentei um final impactante, porém coerente com o que se espera desses personagens, se estes fossem mesmo levados à cena. É isso. Se alguém tiver interesse em encenar essa peça, é só me contatar... é claro, isso se a censura não bater antes e se os advogados do "Rei" não impedirem a nossa estreia, como costumava acontecer nos velhos tempos e - no caso dele próprio - costuma acontecer ainda hoje.
Boa leitura.
Caderno Almanaque - Jornal Pioneiro | 13/04/2013 |
O Rei e o Carrasco
Sinopse por Diones Camargo
2013. Num luxuoso prédio do bairro da Urca, no Rio de Janeiro, um
homem toca a campainha e é recebido por uma empregada negra vestida com trajes
do século XVIII e usando uma peruca branca. O homem se
identifica como Zé Paulo, um delegado (na verdade, um ex-agente da ditatura) e
velho amigo do dono da casa. A empregada sai para avisar o seu patrão que o tão
esperado visitante chegou.
Após algum tempo, entra Roberto Carlos descendo de um elevador
vindo do alto, de um ponto onde não se pode ver. Sua incensada voz chega antes.
Depois é a vez de seu corpo mutilado - como um Ricardo III da nossa época. Em
pânico, o “Rei” expõe a situação catastrófica na qual se encontra: sua
biografia não-autorizada, escrita por Paulo César de Araújo está
prestes a ser relançada no mercado mesmo após ter sido recolhida das
prateleiras anos atrás, a mando de seus advogados. Graças a uma nova lei
aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e prestes a ser sancionada pela presidenta do país, a tal lei
permitirá a divulgação de imagens e informações biográficas de personagens
públicos, a despeito da vontade desses. Por esse motivo, o “Rei” está apavorado
com a possibilidade do conteúdo do tal livro de Paulo César ser finalmente
levado ao grande público – principalmente as partes em que se refere à sua proximidade
com o alto escalão do poder durante os anos da ditadura militar no Brasil. A
fim de evitar o escândalo iminente, ele pede ao Mr. DOPS (apelido dado a Zé
Paulo pelos seus amigos mais íntimos, quando este ainda era delegado do
Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo) que encontre um jeito de
impedir mais uma vez a divulgação do conteúdo do livro, e de preferência
varrê-lo para baixo do tapete da história, tal como havia feito em 1979, quando
o ex-mordomo do “Rei” havia tentado o mesmo – ato subversivo que foi impedido
por um processo que acabou deixando o pobre homem à beira da miséria e o tal
livro atirado ao completo esquecimento.
Preocupado, o Mr. DOPS informa que na atual conjuntura política é quase impossível qualquer impedimento explícito ou amedrontamento ainda que sutil, já que os tempos são outros e que agora a Comissão Nacional da Verdade – órgão que pretende expor ao povo as ações das forças armas e da polícia durante o regime militar, e investiga as violações dos direitos humanos naquele período – está de olho em cada um dos ex-agentes da ditadura, e se alguém os denunciar por abuso de poder ou qualquer outro crime, eles podem vir a se complicar ainda mais. Portanto, além de terem “esqueletos no armário” (e, principalmente, ossos no fundo do mar) o suficiente para se preocuparem pelo resto desta e de tantas outras vidas, qualquer ato impensado que possa parecer resquício de censura será visto com maus olhos pela opinião pública, o que dará mais força à Comissão de Direitos Humanos, instituição que supervisiona de perto a abertura desses arquivos e que pede constantemente a punição dos responsáveis pelos crimes daquela época, tal como vem ocorrendo em alguns países da América do Sul e ao redor do mundo.
Em meio ao desespero de ambos, eles chegam à única solução
possível: os dois devem unir forças para, através de seus prestígios na grande
mídia e influências políticas, colocar no mais alto trono da Comissão de
Direitos Humanos alguém que fará de tudo para atrapalhar o andamento das
investigações e o cumprimento da lei; alguém capaz de ser tolerado pela maioria
da massa de cordeiros e, assim, impedir definitivamente a divulgação de
qualquer documento secreto que possa causar constrangimentos indesejáveis –
sejam arquivos repletos de crimes da ditadura militar, seja uma biografia
contendo segredos igualmente inconfessáveis. Nesse momento, tomados por um
senso de responsabilidade com a história a qual estão intimamente ligados, eles
telefonam para alguns dos seus amigos e estes aconselham um único e absoluto
nome acima de qualquer outro na face da terra; um nome santo e irretocável: o
pastor Marco Feliciano. A partir deste momento, começa a campanha para colocar
o deputado no poder a despeito dos seus comentários abomináveis, da reação do
povo e da opinião pública brasileira. Tudo isso em prol da conservação de uma
ditadura velada que ainda impera no Brasil, com seus ícones culturais e
políticos, e suas atitudes e opiniões repletas de conservadorismo e abusos diários
de poder.
No final, a peça termina com a empregada negra do Rei sendo
chicoteada pelo Mr. DOPS a mando do pastor Marco Feliciano, enquanto Roberto
Carlos – alheio a tudo – canta uma de suas melosas e absurdas canções.
Roberto Carlos e o Mr. DOPS da realidade. Para saber mais, CLIQUE AQUI. |
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